Ainda para o Pai!

Pai, eu às vezes acordava e via-te
a vigiar o meu sono, ali tão perto,
no meio da noite, e todos os medos
fugiam para muito longe
como se tivessem asas nos pés
e fogo nas narinas
iguais às dos dragões a fingir
que havia nas histórias que tu
contavas para eu adormecer
devagar, devagarinho,
cabeça a poisar na almofada de flores,
pena ou pétala a beijar o chão.
(...)
Pai, foi contigo que aprendi
as palavras mais belas e difícies,
as palavras feitas de musgo
e de lava, de trigo e de chuva.
Foi contigo que aprendi
o som da palavra amor
empurrada pelo vento
até ao último esconderijo
que tem a tempestade.
José Jorge Letria, Viagem à Flor de um Mês